Tuesday, November 30, 2010

Inverno começa cedo no Reino Unido

A situação repete-se todos os anos: o frio aperta e o Reino Unido tem que racionar o abastecimento de Gás Natural. Este Inverno não é excepção mas com a diferença de que o frio e a neve chegaram mais cedo do que o habitual.

A situação energética no Reino Unido é um dos casos mais irónicos na União Europeia e no talvez no mundo. Depois de décadas de abundância providenciadas pelo Mar do Norte, em que o Gás Natural e Petróleo foram suficientes para o Reino Unido se tornar exportador, este estado contempla hoje um cenário de constrangimento. Não só não foram pensadas as alternativas para quando o Mar do Norte entrasse em declínio como foi planeado o fim do programa Nuclear para a mesma altura.

Hoje quase metade da electricidade consumida no Reino Unido é gerada a partir do Gás Natural, numa senda de consumo crescente que tenta colmatar a quebra da geração Nuclear ou a Carvão. Mas ao mesmo tempo a produção interna cai a um ritmo estonteante, por volta de 10% ao ano. As importações deveriam pois estar a crescer a um ritmo superior a esse, mas não estão.

No mercado continental, ao qual a Grã-Bretanha está ligada por gasoduto com a Bélgica, não tem sido possível encontrar os volumes necessários, para além de que, em períodos em que o preço no continente é superior ao das ilhas, o fluxo do gás é invertido e o Reino Unido torna-se exportador. Resta o mercado global de gás liquefeito transportado por navio, o qual tem aparentemente boas perspectivas perante a disponibilidade recente de gás natural não convencional na América do Norte. No entanto até ao momento o gás natural liquefeito também não está a ter impacto nas reservas do Reino Unido.

No Inverno passado o abastecimento de Gás Natural à indústria foi cortado pela Rede Nacional de energia várias vezes entre Janeiro e Fevereiro, em especial depois de a Grã-Bretanha ter ficado totalmente coberta de neve na primeira semana de 2010. Estes cortes selectivos permitiram manter o abastecimento doméstico e a geração eléctrica. A meteorologia na semana que presentemente decorre parece ser semelhante, mas o Inverno está ainda agora a começar.

Para esta noite a previsão meteorológica é de temperaturas de -20 ºC em partes da Escócia. Falando à BBC, alguns escoceses referiram que tal quantidade de neve em Novembro é algo que as gerações actuais nunca tinham testemunhado. O que em si é parte do problema que o Reino Unido enfrenta: depois de décadas a prever tempo meteorológico cada vez mais quente, a autoridade local de previsão, o Mett Office, viu-se obrigado a suspender as suas previsões de longo prazo, sob a pressão de vário falhanços rotundos consecutivos. Há menos de dez anos o Mett Office anunciava o fim da neve em Inglaterra, mas a realidade é hoje o exacto inverso.

Com as reservas de Gás Natural 20% abaixo do que eram por esta altura o ano passado, não demorará até que a Rede Nacional de energia reinicie os cortes de abastecimento selectivos. Restará saber se será já este Inverno que as populações sentirão na pele a crise energética do Reino Unido.

Reuters
Could Britain's gas stocks run out this winter?
By Karolin Schaps
LONDON | Tue Nov 30, 2010 11:57am GMT

The British gas market could be caught short this winter as an early cold snap sees suppliers tapping into storage a month earlier than last year, eating into stocks needed for when demand usually peaks early in the year.

Wholesale gas traders started withdrawing from Rough -- Britain's only long-range storage facility -- two weeks ago and supplies have been sinking since to about 17 percent below levels seen this time last year, data from network operator National Grid showed.

The premature and pronounced drain on the site under the North Sea, which holds the vast majority most of Britain's back-up gas, could spell supply jiters early next year.

"If you do the numbers, storage will be empty some time in early February if it stays this cold," said Jason Durden, energy trader at Energy Quote JHA.


Saturday, November 27, 2010

Os mercados internacionais de mercadorias e matérias primas estão estruturados de forma a que possam ser hoje acertadas transacções que só decorrerão daqui por alguns meses ou mesmo alguns anos. Um vendedor pode colocar no mercado um contracto para a mercadoria que irá disponibilizar, não agora, mas daqui por algum tempo e da mesma forma o comprador pode adquirir um contracto sobre mercadoria a disponibilizar no futuro. Estes contractos têm o nome elucidativo de Futuros.


Os Futuros servem vários propósitos, e.g. permitem ao vendedor encaixar capital com antecedência, ao comprador defender-se num cenário de preços crescentes. Mas talvez a mais importante das funções destes contractos seja o controlo que exercem sobre o armazenamento. Numa situação em que os Futuros atingem preços superiores aos do mercado actual existe um incentivo para que o vendedor não disponibilize de imediato toda a sua mercadoria, mas que armazene parte para vender mais tarde. Na situação inversa, com os preços dos Futuros inferiores aos do mercado actual, o vendedor tem um incentivo para vender não só a sua produção actual como aquela que poderá eventualmente ter em armazém.


No mundo financeiro anglo-saxónico estes dois estados do mercado de Futuros têm nomes específicos: backwardation para quando o preço dos Futuros é cada vez mais baixo, quanto mais distante é a data de entrega e contango para uma estrura de Futuros que encarece com a distância à data de entrega. O contango é usualmente um sinal de um mercado bem abastecido no curto prazo, ao passo que em backwardation um mercado está usualmente perante escassez no imediato.


Nos meses que se seguiram ao impacto inicial da crise financeira em 2008, abriu-se uma forte estrutura de contango no mercado do petróleo, os contractos para 2011 chegaram a ser valorados ao dobro do preço de negociação imediata no início de 2009. Perante este sinal as companhias petrolíferas começaram a armazenar petróleo em bruto, não só em reservas estratégicas mas também em petroleiros, que passaram assim da função de transporte para a de armazenamento.


Apesar de na OECD a retoma económica não ser ainda consistente, noutras blocos o aumento do consumo não conheceu tréguas, pelo que lentamente se fechou a folga criada nos mercados pela crise. Ao mesmo tempo fechou-se o contango, de tal forma que hoje os petroleiros usados como armazéns estão de volta ao transporte. Os media falam de um regresso a backwardation nós próximos seis meses.


O mercado do petróleo está de certa forma a voltar a um ponto semelhante áquele em que estava em 2004, quando a primeira grande subida de preços do século XXI teve início. A diferença é que os preços são hoje o quádruplo do que eram nessa altura.



Bloomberg
Oil to Enter Backwardation `Rapidly' on Rising World Demand, Barclays Says

By Justin Carrigan
Nov 25, 2010 10:45 AM GMT+0000

Oil markets are poised to enter backwardation, with prompt-delivery prices higher than those for later supply, as demand for crude increases around the world, according to Barclays Plc.


“Global spare crude capacity has fallen this year and is likely to end the year at only a little above 5 percent,” a team led by Paul Horsnell, head of commodities research at Barclays Capital in London, wrote in a report yesterday. ``We expect a more volatile and backwardated market to emerge rapidly.”


West Texas Intermediate crude, the U.S. benchmark grade, hasn't been in backwardation since November 2008 on the New York Mercantile Exchange. The January delivery contract traded 56 cents below the February contract on the Nymex at 10:40 a.m. London time today. Oman futures on the Dubai Mercantile Exchange went into backwardation Nov. 15, with the January contract trading at $83.50 a barrel today, a 3-cent premium to February.


World oil demand rose by 2.41 million barrels a day this year, the second-strongest rate in the past 30 years, according to Barclays.

Friday, November 19, 2010

O que os políticos precisam de ouvir

De todos os estados da União Europeia o Reino Unido foi talvez aquele mais favorecido pela Natureza no que toca a combustíveis fósseis. Em terra com importantes reservas de carvão e no mar com o petróleo e o gás do Mar do Norte. Estes últimos recursos foram até preponderantes à escala global, permitindo que a OCDE vencesse a crise energética dos anos 1970 e despoletando o colapso dos preços do petróleo em 1985, abrindo assim a porta a duas décadas de crescimento económico sem precedentes.

O Reino Unido optou por uma rápida utilização dos recursos do Mar do Norte, tendo sido um exportador líquido de energia durante quase 30 anos. A produção de gás e petróleo nesta região passou o seu pico no virar de século, abrindo-se desde 2005 um importante défice comercial na área da energia com a procura a ultrapassar claramente a produção interna.

Foram talvez estas décadas de abundância que motivaram uma política energética de grande laxismo, cuja lógica é difícil de compreender. Apesar de ter sido um estado pioneiro na utilização da energia nuclear para fins civis, foi programado o abandono do parque nuclear exactamente para o a época em que o Mar do Norte entraria em declínio. Paralelamente, foi adoptada uma estratégia de incumprimento com a legislação comunitária que implicará na próxima década a retirada de boa parte do parque de geração eléctrica térmica a carvão. Nos dez anos que se seguem a capacidade de geração eléctrica do Reino Unido será reduzida a apenas uma fracção do que é hoje; no que toca ao petróleo, terá de ser quase todo importado.

A princípio pareceu existir uma aposta no gás natural para colmatar o fosso que se vislumbra a curto prazo entre procura e oferta de electricidade. Gasodutos ligando a Grã-Bretanha à Bélgica e à Noruega pareciam abrir um mercado de gás que permitiria ao Reino Unido abastecer a procura interna. Mas gás é coisa que não abunda propriamente no continente europeu, bem pelo contrário, a dependência no abastecimento do Norte de África e da Rússia têm tornado este um mercado cada vez mais difícil. Nos últimos Invernos têm sido cada vez mais frequentes os períodos de escassez com a Rede Energética a ter que cortar o abastecimento à Indústria de modo a que nas habitações e nas centrais de geração térmica não falte o gás. A cada nova Primavera as reservas estratégicas de gás chegam a níveis mais baixos que na anterior.

Nos últimos tempos tem-se dado uma mudança de rumo político, desta feita em direcção às energias renováveis. O governo da Escócia anunciou um programa para transformar o sector da geração eléctrica para fontes totalmente renováveis em apenas 15 anos, fortemente dependente da energia eólica. Não é de alguma forma explicado como compensará a rede eléctrica a intermitência do vento, ou como armazenará o excesso do Outono e da Primavera para responder à procura no Verão e no Inverno. Tal como foi fácil ao executivo londrino dizer nos anos 1990 que o envelhecido parque nuclear não seria substituído, é agora também fácil propor metas mirabolantes nas energias renováveis para 2025.

O abastecimento de gás natural e electricidade no Reino irão experimentar sérias falhas de abastecimento no curto prazo, talvez já nos próximos 5 anos. A lógica política de chutar os problemas para a frente, em que se aparenta planear no longo prazo mas em que não se faz mais que sacudir a água do capote para quem se seguir no ciclo político, subscrita por todos os executivos desde Margaret Thatcher, nada pode contra a dinâmica da exaustão dos combustíveis fósseis.

A algum ponto no futuro o Reino Unido terá que voltar ao Carvão e ao Nuclear, reconhecendo assim que não podia simplesmente desejar que estas energias e as suas desvantagens desaparecessem. Mas a essa altura já será tarde.



Speech to Scottish Parliament
Rupert Soames
12th November 2010.

[…]

I also believe that in many countries politicians have found that Energy Policy is an irresistible sand-pit in which to play. Talking about Energy and CO2 reduction allows them to project all sorts of appealing political characteristics; clean, caring, modern, technically-savvy, far-sighted, broad-minded; and all this could be achieved without any real consequences, no matter how bonkers the policy. So far, politicians have had the luxury of sounding good by setting targets which are so far out in time that whether they are sensible or achievable or not, nobody can possibly know. A 20% reduction in carbon emissions by 2025? Don’t be a bloody Jessie, let’s make it 34% by 2020, and for good measure, let’s make it legally binding! The problem is that sooner or later the happy passengers on the good ship Energy Policy will meet the jagged rocks of the Three Great Truths of electricity generation and supply.
The First Great Truth is that we cannot live without reliable and plentiful electricity. Like water, like air, like food, we cannot do without it, and even brief shortfalls would be catastrophic. So any policy has to be prudent and practical in terms of technology, engineering, resourcing and financing.
The Second Great Truth is that everything about the equipment required to generate and distribute electricity takes a long time to build and is quite fantastically expensive. And the cleaner the source of energy, the more fantastically expensive it is.
The Third Great Truth is that this fantastic expense has to be financed by Global Capital Markets and paid for by the consumers and businesses who use the electricity. There is no Third Way in Energy Policy.

[...]

In the UK, we are already close to the rocks, because, over the next 8 years a third of our coal-fired capacity, two-thirds of our oil-fired capacity, and nearly three-quarters of our nuclear capacity will be closed down either through age or the impact of the European Large Combustion Plant Directive. Absent a massive and immediate programme of building new power stations, with concrete being poured in the next two years, we will be in serious danger of the lights going out.

[…]

Is this alarmist? ...... Well let’s look at what the people responsible for building the UK’s power infrastructure are actually doing. In the last 12 months the construction of three major new power stations – Kingsnorth, Baglan Bay and Drakelow have all been put on hold. And of the 7,000 MW of windfarms that have planning consent, less than a third are actually under construction. Why might it be that people who have spent millions of pounds and several years getting consent to build windfarms, are not actually building them? At a time when the UK has the lowest level of gas storage in Europe (16 days, against 90 days in Germany and 122 in France), Centrica have just announced that they are putting on hold the building of the Caythorpe gas storage facility. Two days ago, E.ON, one of the UK’s largest energy suppliers, said that it was going to focus its investments in markets outside Europe, and plans to follow EDF in selling its UK power distribution business.

[...]

Tuesday, November 16, 2010

Cinco anos depois

O sítio PicoDoPetroleo.net está no ar há já mais de cinco anos. Este tempo volvido e a associação das palavras pico e petróelo já não parece fortuita. Os média já não as tomam como produto de um qualquer grupo de pensadores marginais, desligados da realidade. Não, o Pico do Petróleo é hoje algo de que, mesmo discordando da sua eminência, se pode falar abertamente sem receio da classificação de catastrofista.

Há ainda a relutância das entidades oficiais em falar abertamente do assunto, em parte porque não têm grande solução para oferecer, em parte por recearem espalhar o pânico. É o exemplo da Agência Internacional de Energia (AIE), que no último número da sua publicação anual “Perspectiva Energética Mundial” (World Energy Outlook) escreve por um lado que não há pico do petróleo no horizonte, mas por outro apresenta números que mostram a sua inevitabilidade a curto prazo. O garante do cenário de crescimento da AIE é uma fatia de produção a que é dado o elucidativo nome de “por descobrir”, mas que daqui por duas décadas é suposto estar a produzir tanto quanto hoje o faz a Arábia Saudita. A essa fatia acresce ainda outra, os campos “por desenvolver” que deverão no seu conjunto ultrapassar a bitola saudita.



Gato escondido com o rabo de fora, mas hoje felizmente há já muita gente instruída o suficiente para desenterrar o gato pelos seus meios. É esta a principal mudança que se deu nestes últimos cinco anos.

Estamos hoje, em 2010, a viver a época do pico. A produção mundial de petróleo bruto está estagnada há quase seis anos e não deverá modificar-se muito nos anos que se seguem. Algures na próxima década tornar-se-á impossível manter o nível de produção actual passando-se então ao inevitável e irreversível declínio. As consequências já aí estão, com a progressiva redução do volume de petróleo transaccionado internacionalmente desde 2005.

Por ora a vida ainda não mudou muito, em especial para quem ainda conserva o seu emprego, os confortos e comodidades a que havia acesso em 2005 estão ainda em grande medida disponíveis. Mas quer por acção da recessão económica, pelo aumento do desemprego, pelo endividamento soberano, o acesso a bens e serviços será progressivamente mais difícil, em especial áqueles importados. Os problemas que hoje vive Portugal são parte de toda uma dinâmica de transferência de riqueza da OCDE para outras nações que detêm ainda os recursos naturais essenciais ao funcionamento da Economia, em especial os combustíveis fósseis.

É esta última constatação que falta fazer, quer por parte da opinião pública quer por parte dos poderes executivos na OCDE. Falta perceber que a crise que se vive hoje tem uma origem bem definida na dificuldade em providenciar à Economia os necessários fluxos de energia e matérias primas a preços baixos. A realização de tal facto obrigará a uma total transformação das políticas e planos económicos, de certa forma uma ruptura com a mentalidade do Crescimento constante.

E é assim que se justifica continuar a relatar o mundo a partir da perspectiva particular que providencia o pico do petróleo. Será talvez como subir a uma montanha onde o que está para a frente é posto em perspectiva pelo que está para trás. O mundo Visto do Pico.


New York Times Green Blog
Is ‘Peak Oil’ Behind Us?
By JOHN COLLINS RUDOLF
November 14, 2010, 8:47 am

Peak oil is not just here — it’s behind us already.

That’s the conclusion of the International Energy Agency, the Paris-based organization that provides energy analysis to 28 industrialized nations. According to a projection in the agency’s latest annual report, released last week, production of conventional crude oil — the black liquid stuff that rigs pump out of the ground — probably topped out for good in 2006, at about 70 million barrels a day. Production from currently producing oil fields will drop sharply in coming decades, the report suggests.